Decisão do STJ que vetou cobrança deve orientar processos pelo país, 64 em SP
Justiça entendeu que ninguém é obrigado a se filiar a entidade para pagar por serviços e melhorias em ruas
FABIANO MAISONNAVEDE SÃO PAULO
Uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que vetou a cobrança compulsória de taxas de manutenção por associações de moradores deve orientar ao menos 141 processos semelhantes em curso no Brasil --sendo 64 no Estado de São Paulo.
O levantamento foi feito pelo STJ, a pedido da Folha, após julgamento no mês passado no qual foi aceito, por 5 votos a 2, os recursos de dois proprietários de imóveis de municípios de São Paulo.
Moradores de Mogi das Cruzes (a 57 km de SP) e Franca (a 400 km de SP), eles não aceitavam as taxas cobradas pelas associações de bairros e haviam sido condenados em primeira e segunda instâncias a pagá-las --sob a justificativa de que, como eram beneficiados por melhorias, deveriam dividir as despesas.
O STJ, no entanto, entendeu que eles não eram obrigados a estar associados.
O advogado Marcelo Tapai, diretor do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor, avalia que a quantidade de afetados pela decisão é muito maior que as ações já mapeadas pelo STJ.
"Trata-se de assunto cada vez mais recorrente por causa da segurança. As pessoas fecham uma rua, instituem uma associação e compelem todo mundo a pagar uma taxa", afirma Tapai, especialista em direito imobiliário.
Como a decisão ocorreu sob rito dos repetitivos (quando há mais de um processo sobre a mesma questão), a partir de agora caberá recurso apenas se a sentença de segunda instância for contrária ao entendimento do STJ.
Na prática, ela balizará as decisões dos tribunais inferiores --que até podem julgar de forma diferente, mas, chegando ao STJ, a possibilidade de reverter é mínima.
PORTARIA E ASFALTO
O julgamento no STJ pôs fim a um impasse que se arrastava na Justiça havia sete anos no caso do técnico contábil Marcelo Viana, 44.
Morador do Residencial Rubi, em Mogi das Cruzes, ele disse que não quis se filiar por falta de transparência. "É uma panela, decidem entre eles."
Em 2008, quando a taxa era de R$ 50, a entidade de moradores passou a cobrá-lo na Justiça. No processo, seu advogado, Luciano Arias Rodrigues, alegou que Viana não podia ser obrigado a pagar porque a área é um loteamento, e não um condomínio, e que a Constituição prevê liberdade de associação.
O Residencial Rubi diz que, na prática, é um condomínio, com serviços como portaria, segurança privada e manutenção de ruas e esgoto.
"Se ninguém pagar, não tem como fazer serviço de esgoto, consertar buraco no asfalto", afirma Solano Matos, advogado da associação.
'MILÍCIA'
No recurso apresentado ao STJ, a defesa do comerciante João Geraldo Raimundo Jr., de Franca, afirmou que, "por analogia", a ação de associações de moradores "tem a ver com as milícias do Rio" --conhecidas por cobrar por segurança e outros serviços.
"Daqui a pouco as milícias teriam essas taxas regulamentadas", disse o advogado José Antônio Martos.
O Residencial Morada do Verde, segundo ele, começou como um loteamento de alto padrão e, mais tarde, um grupo de moradores criou uma associação e decidiu fechá-lo, colocando uma portaria.
O cliente dele, por se recusar a pagar taxas, teve a entrada de parentes e entrega de cartas dificultadas. Precisou alugar uma caixa de correio. A associação do residencial não quis se manifestar.